Era uma noite muito quente, no fim do verão, em Floripa, a rainha das fadas, não podia conciliar o sono. Estava mais pálida que de costume e a cada instante chamava sua empregada de serviço de nome Esmeralda.
- Senhora, disse-lhe por fim, Esperança, porque não sai a passear pelos campos a cavalo? O amarelo disco da lua espelha sua luz doce e brilhante pela relva, espalhando sua doce e brilhante claridade como do próprio sol do amanhecer. A atmosfera está suave e propícia; o céu, límpido; e uma briza suave e fresca faz agitar as folhas das árvores.
- Está bem; mas onde iríamos nós - perguntou impaciente a soberana.
- Vamos à floresta dos pinheiros, respondeu Esmeralda. - É um sítio delicioso; e, precisamente hoje, celebra-se lá a grande festa dos ratinhos para a qual há muito estamos convidados.
- Pois sendo assim, vamos lá.
Logo em seguida ouviu-se um levíssimo rumor de asas e em breves momentos Armilinda e outras damas cruzaram invisíveis os espaço e apareceram sentadas em redor de um tronco grosso de pinheiro, recentemente serrado. Mas as fadas se tinham sentado, surgiu sobre a rústica plataforma que formava a pontiaguda superfície, um gnomo, munido de um instrumento musical, misto de violino e bandolim. O gnomo fez uma reverência, brandiu o arco três vezes, marcando um compasso, e preludiou uma sinfonia original, conjunto de rumores e pisadas furtiva sobre a erva, de estalar de madeira queimando, de ruídos de esgravatar e de espirros de ratinhos.
- Mas que música tão esquisita que devia ser essa! - exclamou Armilinda.
- Todos os ruídos tem a sua música , quando se sabe ouvir, diz o livro que nos deu papai no dia dos nossos aniversários.
- O gnomo, com uma voz cortante e indefinível, pôs-se a cantar:
Saiam já das suas tocas
Alegres ratos dos prados
E, ao som da música, aos brados
celebrem em danças loucas
Os prazeres saborosos
Dos queijos, belos, formosos!
Obedecendo a ação misteriosa do canto, começaram a chagar daqui e dacolá, vestidos com trajes azuis, amarelos ou escarlates, numerosos ratinhos, que em breve formaram grande cadeia. De mão dadas e dançando ao compasso da música o gruo dos bailarinos começo a descrever um circulo, passando por diante das fadas e da da rainha, que os contemplavam encantadas e boquiabertas. Pouco depois, a um sinal do que ia em primeiro lugar na fila, entoaram em coro a canção da festa:
Em muito rudes labores
Se passou este verão
Mas os celeiros estão cheios
De rico grão.
Bailem ratinhos
Dos pés nos biquinhos.
Não tenham medo do inverno
Pois bem seguros já estão
As provisões já nos fiam
Muito à mão.
Bilem ratinhos
Dos pés nos biquinhos.
- Sim, - interrompeu Armilinda; mas não contam com os gatos e as ratoeiras, que não os deixarão fazer das suas. Isso acontece com muita pessoas, que só vêem o lado bom das coisas, sem contarem com os inconvenientes... Me interrompeste pela segunda vez. Toma cuidado poque, conforme cominamos, na terceira vez calo-me e ficarás sem saber o final da história.
- Com ia dizendo, os ratos cantavam e a cada novos versos, a dança ia se animando mais, e as voltas sucediam-se com redobrado ardor. Quando depois de longo tempo cessou o canto e o baile os gnomos serviram um banquete em que abundaram confeitos de todas as espécies, tais como frutas e sementes, guloseimas a, fiambres e embriagadoras bebidas do cálice das flores. A princípio só se ouvia o ruído de quebras e triturar os confeitos que eram devorados com avidez pelos bailarinos fatigados e esfomeados; mas, ao passo que o apetite destes se foi saciando, e sobretudo quando as frequentes libações desembaraçaram o caminho para a expansão comunicativa, entabularam-se mil conversas sobre diferentes assuntos. Em breve se formaram numerosos círculos, agrupando-se aos concorrentes segundo as suas idades, afeições e maneiras de sentir. De um lado tratava-se de processos mais eficazes e rápidos para a abertura de galerias subterrâneas, perfuração de paredes, escalada de prateleiras e de obstáculos e ratoeiras; do outro lado, um gruo de damas da aristocracia rateira, expunha e discutia opiniões sobre o valor alimentício de presuntos e conservas; mais além a gente moça falava de modas ou entoava as canções do dia; por toda a parte reinavam a maior animação e regozijo. Entre os ratos vaidosos houve quem se gabasse de ter assistido ao célebre congresso de "Ratópolis" e de ter rebatido o deitado por terra o maldoso projeto de conseguirem uma cascavel para matar o gato do local. Foi muito defendido por alguns, mas venceu a sugestão de "sempre fugir correndo", considerado muito mais prático em acordo com os instintos d raça. Houve também interessantes histórias de proezas e aventuras maroteiras. Uma das ratazanas mais corpulenta e respeitável contou como tinha conseguido entrar num armazém de presuntos e carnes defumadas, onde tão bem passara uma boa parte do ano se fartando do bom e do melhor. Contou que ali criou duas numerosas ninhadas com todo o conforto desejável. Mas um dos ratos mais jovens da família contou que teve a perigosa e imprudente audácia de se agarrar num presunto que estava pendurado no teto e roer a corda; atitude que causou sua queda estrepitosamente sobre um grande pote, atraindo com o ruído os donos do local, que armados de vassouras e varapaus acabaram com toda a sua ninhada, sem que ninguém tivesse podido salvar, a não ser a narradora,graças a um buraco de um cano onde se escondeu a tempo. Outro dos circundantes contou como, numa despensa, tinha encontrado um magnífico queijo de bola, dentro do qual tinha passado uma boa temporada se deliciando com aquela maravilha. Contou que comeu todo o interior do queijo, deixando apenas a parte externa para enganar os donos. Outros participantes da festa também contaram suas histórias enquanto se serviam das sobremesas com os últimos vinhos.
Terminada a farta refeição, reanimou-se a dança, prolongando-se a festa até que a luz ocultou o seu prateado disco por de traz dos longínquos maciços de arvoredo. Imediatamente ouviu-se o clamoroso canto do galo, anunciando a vinda da aurora, que silenciosa avançou pelo Oriente. Os gnomos sumiram-se na entranhas da terra, e desapareceram coo por encanto as fadas, enquanto os ratos se metiam nos seus esconderijos.
E porque é que desapareceram as fadas e os gnomos quando cantou o galo? As fadas tem medo dos galos?
Não se trata disso, é que os gnomos e as fadas retiram-se sempre quando chega a luz do dia.
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